O Cemitério dos Judeus, da cidade do Funchal, continua num deplorável estado de conservação, apesar de ser um imóvel classificado do Património Cultural da Região Autónoma da Madeira. A esta situação nos referimos em 2004 e 2007. Contudo, até hoje, nada se fez para recuperar o «chão sagrado» dos judeus que foram sepultados na ilha da Madeira, nos séculos XIX e XX.
Qualquer investimento nesta zona deveria respeitar a memória do lugar.
A comprovar o abandono a que foi votado o velho cemitério judaico e as implicações deste bem cultural no investimento imobiliário projectado para o Toco, transcrevemos aqui, com a devida vénia, o artigo publicado no Diário de Notícias, Funchal, 27 de Maio de 2009, p. 19, da autoria do jornalista Francisco José Cardoso:
Lei judaica proíbe mudar o local dos cemitérios
Embaixador de Israel está cá e é recebido hoje por Jardim. Processo encalha ‘Toco’
O embaixador do Estado de Israel em Lisboa defende a construção de um muro de suporte para o cemitério judaico existente na zona do Lazareto, em Santa Maria Maior. A posição de Ehud Gol, no cargo há quase cinco meses e de visita pela primeira vez à Madeira, é aliás, parecida com a do seu antecessor quando se colocou, em 2003, a hipótese de trasladação dos corpos para o cemitério de São Martinho.
Este deverá ser um dos pontos de destaque das reuniões que o diplomata tem realizado desde segunda-feira com entidades e autoridades regionais, a culminar hoje com uma recepção de Alberto João Jardim na Quinta Vigia. Em declarações exclusivas ao DIÁRIO, Ehud Gol lembrou que a religião que professa impede a mudança de local dos cemitérios e, por consequência, é muito complicado fazer trasladações dos corpos como pretende a Câmara do Funchal, com apoio do Governo Regional.
Para tomar melhor conhecimento do estado deste cemitério, datado do século XIX e em completo abandono, o diplomata israelita deslocou-se ontem ao local. Acompanhado por um cidadão do seu país a viver na Madeira, Ehud Gol pôde constatar que a degradação da infra-estrutura requer uma solução que tarda.
“Estou ciente do problema, com algumas das sepulturas à beira da falésia e o seu estado é muito mau”, começou por referir. Sabe, na nossa religião não se podem remover cemitérios, uma situação que podia ser resolvida mais facilmente com a construção de um muro de suporte que proteja as sepulturas que estão em perigo de cair ao mar”, afirmou.
Ehud Gol lembrou ainda o anterior embaixador em Lisboa, Shmuel Tevet, que esteve também na Madeira (em 2003), altura em que se levantou a possibilidade de vir de Israel uma delegação que viesse encontrar uma solução em conjunto com as autoridades regionais.
“Vamos tentar encontrar uma solução melhor que a mudança do cemitério”, afirma. “É claro que gostaríamos de ter uma solução que mantivesse o espaço com a dignidade e de acordo com a lei judaica e local”, reafirma, garantindo sempre que as autoridades madeirenses devem ter sempre papel crucial nesta matéria.
Em tom diplomático, Ehud Gol lembra que há outros temas que podem trazer bons frutos para a Madeira e que pretende apresentar às autoridades e entidades públicas e privadas com quem tem mantido reuniões. “O Turismo é o assunto principal”, exemplificou. “A Madeira tem grandes paisagens, uma ilha fantástica e até tem um Casino, que pode ser atractivo”, concluiu.
O certo é que, caso se mantenha esta ideia de manter o cemitério no Lazareto, este é mais um impedimento que o projecto privado calculado em 390 milhões de euros vá para o terreno.
Tradição a respeitar
O caso já se prolonga há alguns anos e ficou ainda mais conhecido quando foi anunciado um projecto de ‘frente-mar’ para toda a zona leste do Funchal, e que implicaria uma mudança de local do cemitério judaico. Já se falou em transformar o local em atracção turística, dada a sua localização e interesse histórico, mas o mais importante em todo este processo será o respeito por uma cultura que, em séculos passados, teve o seu papel no desenvolvimento socioeconómico da Madeira.
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